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DIÁLOGO

Lula cita ''clima muito ruim'' na Câmara um dia após bate-boca entre Fernando Haddad e Nikolas Ferre

Em evento sobre o acordo de reparação de danos para a Bacia do Rio Doce, o presidente afirmou que as ''pessoas estão aprendendo a viver de mentiras''

Na manhã desta quinta (12), Lula afirmou que o clima na Câmara dos Deputados é "muito ruim". A fala aconteceu um dia após o ministro da Fazenda Fernando Haddad e o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) terem protagonizado uma discussão durante uma audiência pública.

Sem mencionar nomes, Lula afirmou também que "as pessoas estão aprendendo a viver de mentiras". No bate-boca desta quarta (11), Haddad reclamou que os deputados Nikolas Ferreira e Carlos Jordy, também do PL, teriam citado dados falsos sobre a situação fiscal do país.

— Estamos vivendo momento muito desagradável no mundo, há certa raiva no ar, há um certo desconforto entre a humanidade, muita intriga, ódio e xingamento. Mesmo na Câmara o clima é muito ruim. Tem Deputado que não quer falar, só quer pegar celular, olhar na cara dele, falar uma bobagem e ar pra frente. As pessoas estão aprendendo a viver de mentiras — afirmou Lula nesta quinta (12), durante evento de anúncio de investimentos pelo acordo de reparação da Bacia do Rio Doce.

A discussão desta quarta (11) aconteceu na reunião conjunta das comissões de Finanças e Tributação e de Fiscalização Financeira e Controle. Na ocasião, Nikolas e Jordy criticaram o governo federal e as medidas propostas pela Fazenda, mas se retiraram da audiência antes de ouvir as explicações do ministro. Ao retomar a palavra, Haddad disse que os deputados fugiram ao debate, o que era uma "molecagem", e complementou que "desrespeito é mentir".

Além de Lula, o evento desta quinta, em Mariana (MG), contou com vários ministros, como Rui Costa, Marina Silva e Alexandre Silveira. Houve a presença também de deputados e senadores de Minas. Presente, Rodrigo Pacheco (PSD) foi chamado de "futuro governador de Minas Gerais" por Lula.

Vaias no início da cerimônia
Na abertura do evento, Lula interrompeu o discurso do prefeito de Mariana (MG), Juliano Duarte (PSB), para lhe defender de vaias e protestos da população local. O prefeito estava sendo muito vaiado até que o presidente pediu a palavra, pediu respeito ao seu "convidado" e disse para que os manifestassem aguardassem o final do evento.

Juliano Duarte começou a ser vaiado desde que iniciou seu discurso, relembrando sua trajetória política na cidade. Quando ele ou a relembrar os danos à população de Mariana após o rompimento da barragem que matou 19 pessoas e contaminou o Rio Doce, parte do público começou a gritar "Ih, fora" para ele.

Nesse momento, Lula pediu a palavra para defender o prefeito.

— Não tem sentido o presidente da República vir a um lugar, convidar autoridade, ele chegar aqui e ser mal recebido. Ninguém convida ninguém para ir na casa da gente para ser mal recebido. Então eu queria que os companheiros que estão se manifestando contra, deixem acabar o ato. Quando começar campanha política, faça sua campanha, seja contra. Mas hoje não! — afirmou Lula, sob aplausos, que ainda disse que o momento é "histórico" para a Mariana. — Não pensem que foi fácil construir esse acordo, porque quando chegamos na presidência estava parado há 8 anos e ninguém negociava. Hoje é um dia institucional, o prefeito é nosso convidado. Não é proibida a liberdade de expressão. É apenas responsabilizando a liberdade de expressão.

Após a fala de Lula, o prefeito retomou seu discurso e foi até aplaudido em alguns momentos. Ele relembrou os "momentos difíceis" vividos pela população de Mariana após o rompimento da barragem.

— Desde o dia 5 de novembro de 2015 (data da tragédia), nenhum presidente pisou em Mariana. Por isso, nossa gratidão e nosso respeito. Mariana enterrou vidas, memórias, dignidade. Foi a maior tragédia ambiental, considero como crime ambiental, do mundo, isso tem que ser registrado — afirmou o prefeito, que celebrou os anúncios para construção de um hospital universitário na cidade, dentre outros investimentos. — Mariana não quer ser conhecida como a cidade da lama. E sim uma cidade que teve uma reconstrução coletiva.

Críticas à Vale
No seu discurso, ao final do evento, Lula fez críticas à Vale em relação à falta de reparações definitivas 10 anos após a tragédia.

— A Vale, se fosse uma pessoa, estava garantida nas profundezas não sei do que — exclamou o presidente, que depois elogiou a nova istração da empresa. — A a Vale era uma empresa muito boa no ado. Depois que ela virou "corporation", ela não tem mais dono. A diretoria ada é responsável. Porque hoje a nova diretoria da Vale está conversando com governo, quer conversar com movimento, quer conversar com sindicato. O que eu quero é que a Vale se recupere, volte a ser a primeira empresa mineradora do mundo. A nova diretoria sabe que a relação com o povo tem que ser respeitosa, civilizada, e com muito respeito.

O presidente também destacou que a partir de agora o governo federal também é responsável pela conclusão das reparações.

— Nós não temos mais desculpa, agora as coisas têm que acontecer, agora é da nossa responsabilidade — disse o presidente. — Agora, quando o povo de Mariana quiser xingar, vai falar a Vale é isso, mas também vai falar que o governo é aquilo.

Novo acordo de reparação
Mariana foi uma das cidades que não aceitou o novo acordo de reparação pela tragédia de 2015. Como mostrou O Globo, apenas 26 dos 49 municípios contemplados am os novos termos, homologados no final do ano ado pelo STF, com previsão total de R$170 bilhões.

Um dos principais motivos para a não foi a presença de parte dessas cidades na ação contra a BHP em Londres, com pedido bilionário de indenização. Quem assinasse o acordo brasileiro precisaria abrir mão de qualquer processo judicial no Brasil ou no exterior.

Os municípios que não aderiram ao acordo reclamaram dos valores apresentados pelas empresas BHP e Vale. Os rees diretos aos 49 municípios somariam R$6,1 bilhões nos próximos 20 anos. Desse montante, a maior fatia seria justamente para Mariana, a cidade mais afetada: cerca de R$, 1,3 bilhão.

Entre as críticas que motivaram a não , cujo prazo se encerrou em março, a prefeitura de Mariana citou o fato dos governos estaduais de Minas e do Espírito Santo, além da União, receberem mais que as prefeituras.

Mas, mesmo sem receber os rees diretos das empresas, Mariana, assim como toda a bacia do Rio Doce, será beneficiada pelas ações coletivas de reparação, em parte de responsabilidade do governo federal.

Juliano Duarte explicou que Mariana será beneficiada pelo ree de R$ 139 milhões nos próximos dois anos. Além disso, o município vai doar área para a construção do novo Hospital Universitário, em parceria com a Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), e contribuir com mais R$20 milhões para o projeto.

Outro anúncio do governo federal, como parte do acordo, é o contrato com a Caixa para Programa de Transferência de Renda (PTR), que vai pagar R$ 3,7 bilhões em quatro anos. Nesse período, agricultores, pescadores e moradores impactados pela tragédia receberão um pagamento mensal de 1,5 salário mínimo por três anos, e mais um salário mínimo mensal no último ano do programa. A expectativa é que sejam beneficiadas 15 mil famílias de agricultura familiar e 22 mil pescadores.

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